“O machismo aprisiona o homem mais do que o dá vantagens”, avalia psicanalista

  • Por Jovem Pan
  • 29/09/2017 14h30
Johnny Drum/ Jovem Pan

Os efeitos destrutivos que o machismo pode ter na vida das mulheres não é nenhuma novidade. O que pouco se discute é o aprisionamento que ele pode gerar também na vida dos homens. É o que disse Simone Demolinari, psicanalista clínica e mestre em comportamento humano, em entrevista ao Pânico na Rádio nesta sexta-feira (29).

“Podemos analisar os números dos suicídios divulgados pela Organização Mundial da Saúde, por exemplo. Do total, 79% são de homens. Isso tem uma série de razões. O homem não desabafa com frequência, guarda tudo para si. E, principalmente, sente muita pressão. O machismo não dá espaço ao homem para ele não ser bem-sucedido profissionalmente, para ele desabafar, para ele fracassar na cama. O machismo o aprisiona mais do que dá vantagens”, explicou.

A mineira esteve na bancada para divulgar o livro Verdade Oculta – a Vida íntima da Emoções. De acordo com ela, a ideia de escrevê-lo apareceu depois que seu nome ficou conhecido entre o público ao aparecer em alguns programas de televisão e assinar artigos em revistas e jornais. Com isso, imediatamente começou a receber cartas e e-mails de pessoas desconhecidas que queriam contar mais detalhes sobre suas vidas, frustrações e sofrimentos.

“Normalmente as particularidades das pessoas não são contadas. Falar sobre fracasso é como fazer um atestado de falência. Todos contam só a melhor parte. Na verdade, a vida não é assim, somos feitos de boas e má emoções. E lendo os relatos dos leitores percebi a riqueza de coisas contadas por trás das máscaras. Tive vontade de pôr em um livro aquilo que não é dito. Foi como nos desnudar dessas mascaras. Aí está a Verdade Oculta”, contou.

Abordando ainda os temas sofrimento e frustração, Simone Demolinari comentou que somos seres “biopsicoculturais”, ou seja, temos predisposições, heranças genéticas, um “imput” psicológico que nossos pais criam e um papel social do qual não há como fugir. Isso tudo dita as regras de um contrato social de que todos têm conhecimento. Aqueles que resolvem seguir esse contrato sem necessariamente se encaixar nele, porém, passam por um conflito interno. Como exemplo, citou que a sociedade nos diz que temos que nascer, crescer, casar, ter filhos, arrumar um emprego e morrer. Mas e aqueles que não querem casar?

“Quando você engole esse contrato e fica querendo seguir no rebanho porque você julga que isso é o correto, começa o problema. Muitas pessoas vão ao meu consultório falando que precisam reescrever sua própria história (…). E a tristeza deriva também da comparação. A grama do vizinho sempre será mais verde. Isso é uma bobagem. Você tem que comparar sua evolução com você mesmo para conseguir ver se avançou. Não com um milionário”, afirmou.

A convidada comentou também a importância do sofrimento em nosso desenvolvimento pessoal, a diferença entre tristeza e depressão, a consequente necessidade (e o problema do vício) por medicamentos antidepressivos e aquela que considera ser uma das grandes questões da atualidade, os limites (ou não) na utilização das redes sociais.

“Ficamos condicionados igual um zumbi, tropeçando no meio da rua. Todos estamos nessa. Esses dispositivos te tiram da solidão. Receber uma notificação mostra que tem alguém pensando em você. E a solidão é o mal do século. A vida no celular é melhor que a real. Nela existe uma autonomia maior, qualquer um entra e sai sem ter que justificar, deleta quem quiser, filtra com quem quer estar. Sem contar que a gente gosta de criar personagens e às vezes eles ficam mais interessante que a nossa vida real. Nossa capacidade imaginativa pode ser maior que a nossa capacidade de realização. Isso é interessante. A mentira é tudo que você gostaria que fosse verdade. A mentira é reveladora”, concluiu.

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